segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Psicanálise com bebês: a relação dos pais com seu bebê e o transtorno da depressão pós-parto


As teorias psicanalíticas têm o mérito de ter insistido na importância das primeiras relações da criança enquanto experiências fundamentais no desenvolvimento do ser humano. Para compreender um pouco melhor os diferentes métodos e técnicas de se atuar na psicanálise com bebês, devemos refletir a respeito dos objetivos desta atuação. De acordo com Queiroz (2011), a psicanálise em geral não deve ter objetivos definidos, pois a finalidade e os resultados são imprecisos. Dentro deste contexto, de se considerar a subjetividade de cada caso e seus objetivos particulares, fala-se do objetivo da psicanálise com bebês ser o de prevenção.
O bebê é tanto um evento novo como uma história antiga no contexto familiar, pois além de trazer características peculiares a ele e se inserir na relação com seus pais, ele encontra nessa relação antigos temas, conflitos e necessidades que muitas vezes não estão resolvidas e são revividas pela família. Os atendimentos na clínica psicanalítica com bebês e seus pais possuem três características que lhe são específicas: são atendimentos breves, focais e o paciente não é o bebê, mas sim, a relação dos pais com seu bebê. O foco deve ser determinado e relacionado com as necessidades que o bebê apresenta. A brevidade do trabalho se justifica porque essas necessidades são urgentes – o desenvolvimento é contínuo e acelerado e não pode parar esperando pela resolução de problemas (FARIAS, 2007).
Deve-se ter em mente que a psicanálise não é só da fala, é também da escuta e é nesse sentido que a clínica com bebês se faz possível. Na clínica com crianças o psicólogo escuta, ou melhor, lê seus desenhos e brincadeiras, com adultos busca a captura dos escritos do inconsciente que se apresentam na fala, e com o bebê trabalha na leitura das inscrições do Outro (os cuidadores primários) em seu corpo, este sendo o campo da escuta analítica nesta clínica peculiar (RIANNI, 2011).
Entre as possibilidades de atuação em Psicanálise de bebês na contemporaneidade, destaca-se o trabalho iniciado por Winnicott e Bion, que ao incluir que devaneios, fantasias e identificações projetivas na relação da mãe com o bebê eram importantes para o estudo do desenvolvimento da vida psíquica, da psicopatologia e das perturbações do vínculo na criança, deram espaço para um início de uma psicoterapia voltada para a relação entre pais e bebê (FARIAS, 2007).
Pinto (2004), afirma que a interação entre pais e bebê relaciona-se estreitamente com a representação que os pais têm sobre a criança, e disso resultam diferentes representações tanto para o pai quanto para a mãe, pois cada um teve seu filho em um momento de sua história e atribuem a esse bebê significados específicos. Klaus e Kennel (1993) ressaltam que há muita importância no laço entre pais e bebês, pois esse relacionamento entre eles é formativo, já que a criança desenvolve um sentido para ela mesma devido a uma auto-imagem que seja segura e apropriada. Sendo assim, o apego com os pais irá influenciar, por toda a vida desse indivíduo, as características dos laços desenvolvidos com outros indivíduos no futuro. Dessa forma esse vínculo entre os pais e seu bebê transcende o interesse em apenas alimentar, trocar ou tomar conta, mas envolve também o cuidado e o colocar-se no lugar do bebê, ter percepções acerca de suas necessidades tanto físicas quanto emocionais.
Um dos motivos comuns para se buscar um psicólogo nessa idade é o transtorno da depressão pós-parto, sendo um exemplo de como os três pressupostos do atendimento aos pais e seu bebê compreendem uma forma específica e eficaz de trabalho. Algumas perturbações psíquicas da mãe (ou do cuidador primário) podem repercutir de forma direta no desenvolvimento da criança, dessa forma, a noção de funcionamento psíquico compartilhado ganha grande importância, pois uma aproximação seguida de um distanciamento da mãe, para o bebê pode causar o aparecimento de transtornos graves no que se refere a contatos interpessoais e nos relacionamentos afetivos futuros (FARIAS, 2007).
Farias (2007) afirma que três questões envolvem-se diretamente com a depressão pós-parto. Uma delas refere-se ao que as mães pensam sobre a depressão pós-parto, pois muitas vezes elas podem queixar-se de dor, cansaço, falta de leite ou outros problemas de ordem física, mas nunca podem queixar-se de depressão, há nesse sentido uma associação com a imagem de uma “mãe má”, que não é socialmente aceita. Uma segunda questão citada pela autora é o fato de os profissionais que cuidam dessas questões prestarem muita atenção nos sintomas do bebê, no desamparo, no desinteresse da mãe, mas não olham para a mãe como deprimida e sim como rejeitante, e dessa forma, não há uma compreensão do problema, restringindo assim a terapêutica. A terceira questão diz respeito ao formato do atendimento psicoterapêutico dessa depressão: individual ou conjunto. O atendimento conjunto é o mais indicado, pois pode tratar simultaneamente a perturbação da mãe e também o vínculo mãe-filho; a presença física do bebê é fundamental, os olhares, os toques, a escuta e outros elementos podem ajudar com que se estabeleça e se fortifique o vínculo da mãe com seu filho, pois o vínculo é o objetivo principal desses atendimentos (FARIAS, 2007).


Referências

FARIAS, E. P. A Clínica psicanalítica com o bebê seus pais. In: CORREA, Olga. (org) Grupo familiar e Psicanálise: ressonâncias clínicas. São Paulo: Vetor, 2007.

KLAUS M. & KENNEL, J.  Pais/bebê – a formação do apego. Porto Alegre: ArtMed, 1993.

PINTO, E. B. Os sintomas psicofuncionais e as consultas terapêuticas pais/bebê. Estudos de Psicologia, 9, 3, 451-457, 2004.

QUEIROZ, T. C. N. A Técnica Psicanalítica com os bebês. Disponível em: http://www.escolafreudianajp.org/arquivos/trabalhos/A_tecnica_psicanalitica_com_bebes.pdf Acesso em 16/10/2011.

RIANI, A. C. P. R. A psicanálise na clínica com bebês. Sociedade de Estudos Psicanalíticos de Juiz de Fora, 2011. Disponível em:
http://psicanaliseebarroco.pro.br/dados/obras/psicanalise%20na%20clinica%20com%20bebes.doc acesso em 15/10/2011.


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